11 de maio de 2016

A aprendizagem de caça nas aves de rapina

Jovem gavião-miúdo (Accipiter striatus)
aprendendo a caçar. Foto: Willian Menq. 
*por: Willian Menq.
A aprendizagem de caça começa cedo na vida de um rapinante. Ainda no ninho, o filhote recebe presas inteiras dos pais. Assim, aprende a reconhecer as espécies que fazem parte de sua dieta e também a dilacerar e rasgar suas presas.

A verdade é que as aves de rapina já possuem muitos dos seus métodos de caça e dieta implantados em seu DNA. Indivíduos jovens podem executar uma sequência completa de caça mesmo sem nunca ter caçado antes.


Porém, mesmo que as aves apresentem um comportamento de caça inato, isso é apenas uma parte do processo. Do mesmo modo que um jovem necessita treinar e exercitar as asas para tornar-se um hábil voador, o mesmo acontece com os métodos de caça, onde é necessário muito treino e experiência para que suas habilidades de caça se desenvolvam.

Desenvolvendo as habilidades motoras - Logo que aprendem a voar, rapinantes jovens de determinadas espécies têm oportunidade de “brincar” com seus próprios irmãos, executando perseguições e acrobacias nos arredores do ninho, como forma de desenvolver suas habilidades motoras, condicionamento e treinamento do comportamento predatório. Em Maringá/PR, já tive oportunidade de observar dois jovens gaviões-miúdo (Accipiter striatus) brincando de ”pega-pega”, perseguindo um ao outro em um parque da cidade (artigo publicado na AO 179). Essas brincadeiras entre os irmãos normalmente são amistosas, sem evidências de agressão, às vezes com inversões de papéis, o que descartaria interpretações de uma possível interação agonística, como a de competição ou predação.

Por outro lado, jovens que normalmente crescem sem irmãos (situação que ocorre na maioria dos accipitrídeos), treinam contra potenciais presas ou até com outros animais. Não são raros por exemplo, relatos de falcões-peregrinos (Falco peregrinus) perseguindo urubus (Coragyps atratus) por "brincadeira", sem a intenção de atingir ou capturar a ave. Por vezes, até indivíduos adultos realizam essas brincadeiras contra outros animais para aprimorar suas técnicas ou apenas por pura “diversão”.

Outra forma de aprender e/ou descobrir novos métodos de caça é a aprendizagem por observação. Indivíduos jovens podem observar uma situação de caça de um outro rapinante (da mesma espécie ou não) e tentar replicar o comportamento. Um jovem falcão-relógio (Micrastur semitorquatus), por exemplo, ao observar sua mãe seguindo formigas-de-correição e capturando uma ave atraída pelos insetos, provavelmente se lembrará e replicará o comportamento de associação ao se deparar com as formigas na natureza.


As primeiras experiências de caça - Assim que os jovens tornam-se independentes, começam a ter suas primeiras experiências reais de caça. O problema é que nem sempre a ave tem noção de quais presas possuem melhor relação custo-benefício, ou dos perigos que uma determinada presa pode apresentar diante uma investida mal sucedida. Um acauã (Herpetotheres cachinnans), por exemplo, pode ir a óbito se executar um movimento errado durante um ataque contra serpentes peçonhentas; um gavião-bombachinha-grande (Accipiter bicolor) poderia ter seu olho perfurado durante uma reação inesperada de pica-pau-de-banda-branca (Dryocopus lineatus), ou ficar vulnerável a um outro predador em solo com os gritos agonizantes da presa.


Desse modo, o índice de mortalidade no primeiro ano de vida de um rapinante é elevado. Segundo Fox (1995), cerca de 60% dos jovens podem morrer nesse período, em sua maioria por fatores relacionados ao pouco êxito das caçadas.

Na medida em que as aves se tornam adultas, melhoram e diversificam suas estratégias de caça, mudando de um método para o outro conforme a situação. Aprendem a julgar corretamente as reações e as distâncias de suas presas, assim como aprendem a reconhecer uma oportunidade (ou o tempo certo) favorável a uma investida.

Flagrante de um jovem falcão-de-coleira (Falco femoralis) perseguindo uma marreca (Amazonetta brasiliensis), que é rapida, forte e muito grande para o falcão. Este é um ótimo exemplo de um rapinante que ainda não aprendeu a identificar as presa mais adequadas. Foto: José Paulo Dias.

Gavião-carijó (Rupornis magnirostris) adulto, próximo a um grupo de anus-branco (Guira guira). Experiente, o gavião sabe que as aves, mesmo próximas, estão fora do seu raio de ataque. Além de não estarem em uma posição favorável a um ataque do gavião, os anus são sociáveis, agressivos e mais rápidos que o gavião. Foto: Willian Menq.
Jovem falcão-relógio (Micrastur semitorquatus) (à direita) acompanhando um indivíduo adulto (à esquerda), talvez aprendendo a caçar (através de observações do adulto e/ou experiências). Foto: Willian Menq.



Quer saber mais sobre as diferentes estratégias de caça utilizadas pelas aves de rapina? Leia este artigo, recém-publicado no site Aves de Rapina Brasil:


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